Como representar um lugar que foi usado para fazer desaparecer os inimigos do Estado? Como pensar a paisagem a partir do que ela encobre? Visto do espaço, o Deserto do Atacama é uma mancha marrom no mapa. A ausência de umidade aproxima o céu da Terra, dando a impressão de que se esticarmos os braços conseguimos tocar as estrelas.
O clima árido da terra castigada e impregnada de sal faz com que restos humanos se mumifiquem e os objetos permaneçam. Esse lugar de mistérios terrenos e celestes está pleno de evidências do passado: peixes moluscos petrificados, minerais enterrados, corpos despedaçados e preservados como pedras.
Fui ao Atacama atrás de algo que pudesse representar ou fazer ver algo que fizesse recordar as vítimas políticas do Governo Pinochet, que usou o deserto para esconder as atrocidades cometidas contra aqueles que se opunham ao sistema ditatorial implementado com apoio da CIA. A cidade mineradora e fantasma Chacabuco foi usada como campo de concentração, lugar esse que já trazia desde sua fundação os abusos do sistema de industrialização do século XIX. Quis inventar uma memória para recordar aquilo que não pôde ser visto. Recupero os índices encontrados no território compondo uma cartografia edificada pela conjunção entre os passos próprios e dos desaparecidos. Assim, no vagar, atravessar o espaço através do aparato fotográfico, seguindo passadas alheias, arrancar do território as coisas mais ou menos vistas e propor uma narrativa para recordar aqueles foram forçados a partir antes.