Talvez esteja no lugar de seu nascimento, fora dos muros da velha cidade de Salvador, para Além das Portas do Carmo, a explicação deste duplo estar no mundo que este bairro docemente nos impõe. No Santo Antônio se está um tanto na cidade, um tanto fora dela. Até mesmo quem por ali apenas passa, sente um não-sei-o-que diferente e quando dá por si já perdeu toda pressa, demora os passos, esquece o tempo, cai em devaneios e imaginanças, vai se antonificando…
Um bairro-quase-aldeia. Rua Direita de Santo Antônio, Rua dos Ossos, dos Carvões, dos Adobes, dos Marchantes, Cruz do Pascoal, Travessa dos Perdões. Cheiros de comida no ar, crianças brincando nas ruas, cães soltos, muitas igrejas, novenas, cortejos, ladainhas. Aqui as vizinhas se falam de janela a janela e ainda colocam cadeiras nas portas para tomar a fresca e trocar notícias que nenhuma TV sabe informar.
Foram muitos os seus povoamentos. Primeiro com os portugueses, que trouxeram o santo lisboeta envolto em saudades e pejado d’esperanças. Depois com os aqui-nascidos-e-criados, gerações e gerações. Mais recentemente, com os que vieram dos quatro cantos do mundo, já não saíram, ficaram e se antonificaram…
Antônio, o homem, era santo e sábio e – adiantando-se a seu tempo – glorificou o ser humano e seus relacionamentos como a suprema obra da divina criação. Não é à toa que é tido por casamenteiro, arrumador das relações, advogado dos apaixonados. Fez milagres com gentes e bichos e até aos peixes pregou contra a usura, a exclusão dos pobres, a inveja, o orgulho, os desmandos dos maus pastores e a corrupção dos administradores. Faz falta hoje.
Mas se o Santo voltasse a este Mundo, no Santo Antônio Além do Carmo ele estaria em casa.