Polaroids do Deserto trata de seca e escassez no sertão cearense, a partir de uma topografia que surge quando o açude Castanhão, o maior do Brasil, tem seu nível de água reduzido drasticamente. São fotografias em filme Polaroid 600 preto e branco, em um exercício quase arqueológico que põe em questão a falta d ́água no nordeste do Brasil.
Se as coisas parecem fora de lugar é porque, muitas vezes, elas estão. Referir-se a fotografias de um espaço que beira um volume de água como “do deserto” é uma extrapolação que fará algum sentido quando percebe-se que o presente trabalho trata da seca no sertão nordestino, e do que (res)surge quando a água falta e o nível dos reservatórios diminui. São vestígios do que foi encoberto quando finalmente a obra de contornos faraônicos que solucionaria muitos dos problemas de escassez de água do semiárido nordestino foi entregue – o açude Castanhão.
O Castanhão, maior açude do Brasil, foi inaugurado em 2002. Por conta de uma seca que atingiu a região entre os anos de 2011 e 2020, seu volume de água chega, ao fim da década, a menos de 5%. É daí que aparecem as imagens de Polaroids do Deserto, fotografias de “fósseis” e cenários possíveis apenas pela diminuição do nível da água.
Neste exercício quase arqueológico, o olhar para baixo – para o fundo – provoca a memória e a lembrança que teima. Paralelamente, o que não é fundo é totem, em um lampejo de olhar rente à vista, buscando o respiro.
As fotografias são feitas em filme Polaroid 600, instantâneo, em cores e em preto e branco. A instantaneidade e volatilidade desse suporte dialogam diretamente com o movimento da água, de fazer surgir e desaparecer de modo irregular.
Sobre tal suporte, Gawan Fagard escreve acerca da obra fotográfica de Tarkovsky: “são pequenos e portáteis edífices que aparecem na emulsão Polaroid, permitindo ao passado dar vida e profundidade a um futuro desconhecido”. Crê-se que as imagens de Polaroids do Deserto tenham um sentido ontológico semelhante. Fagard acrescenta: “as Polaroids de Tarkovsky são reveladoras por natureza: elas revelam uma visionária geografia imaginária, enquanto que idealizam o patrimônio do passado”.