CAMELOT: Do francês;
Mascate, vendedor ambulante, quinquilharias, bugigangas. Camelô.
São Paulo. Cidade industrial e farol para muitos migrantes na década de 70 abrigou, entre tantos outros, um casal Pernambucano que marca compõe a história e a paisagem da Penha de França, o segundo bairro mais antigo da cidade, joia da zona leste paulistana.
“Gosta de trabalhar na barraca vó?”
Gosta, desgosta, quem é que gosta de trabalhar aos 75 anos?
“Mudaria?”, “ Não fia. ‘Tô’ acostumada com meu trabalho já. Muitos anos né?”.
Pouco, 50 anos mais ou menos. Margarida, Dona Magal. José, Zé do Guarda-Chuva. Orgulhinho sem-vergonha de ser ambulante. Sem vergonha nenhuma. Casa própria, quatro filhas criadas e encaminhadas. Netos, e agora bisneto no forninho.
“Polícia não enche o saco mais hoje não. Antes era pior”.
8h, sai Zé pra Penha, Dona Magal arruma a casa e pega o 2726-10 pra acompanhar. Sem pressa, seu Zé já armou a tenda. Garoando, dia bom. Povo só lembra do guarda-chuva quando chove.
“Vivemos em tempos líquidos. Nada foi feito para durar”. Essa é uma das frases mais famosas do sociólogo polonês Zygmunt Bauman, Nada, nem relações, nem bairros, nem tradições, nem guarda-chuvas.
Magal chega e Seu Zé já estava trabalhando, concentrado com o olho cirúrgico na linha e na agulha. Bauman, você pode consertar seu guarda-chuva pelas mãos do meu avô, ou comprar um novo pelas mãos da minha avó.
Povo vai, povo vem, dinheiro trocado vem e vai. 1 real, “Joga na cabeça avestruz, segunda eu pego.” Dona Magal, Dona Magal, com seu cabelo vermelho e olhos de cristal, quem resiste? Dessa vez vai, não custa tentar.
De segunda à sexta, a mais ou menos 50 anos. Dia vai, povo vem. Dia vem, povo vai. Em uma cidade verticalizada, minimalista, cidade limpa, condomínio fechado. Dona Magal vai, e vem. Orgulhinho sem romance, sem frescura, sem muito papo. Só sem vergonha. Orgulhinho sem vergonha dessa minha família, vô, vó, pai, mãe, tias e tios, do trabalho de calçada.
Orgulhinho desse meu berço de aço, de lona, de muamba.
Orgulhinho sem vergonha de existir, esse nosso.