Este ensaio fotográfico, “Lavagem de Cabeça”, oferece um mergulho profundo nos rituais de purificação e iniciação praticados em casas de Jurema, Umbanda e tradições afro-indígenas no litoral do Ceará. Capturado ao longo de uma década de observação participante e engajada nos terreiros do Pajé Barbosa Pitaguary, o trabalho revela a cerimônia de lavagem de cabeça como um momento crucial de compromisso do médium com a espiritualidade.
Mais que um simples registro documental, este ensaio é uma reflexão sobre a própria natureza da imagem etnográfica. As fotografias não apenas retratam o ritual, mas buscam sua “presentificação do invisível”, explorando o “transe imagético” – um estado de imersão profunda que conecta a experiência do fotógrafo e do observador à dinâmica do rito. Influenciado por pensadores como Jean Rouch (“cine-transe”, “câmera-corpo”), o trabalho investiga como a câmera atua como uma extensão do corpo do pesquisador, mediatizando e, paradoxalmente, aprofundando a conexão com a materialidade do sagrado e a performatividade ritualística.
As imagens buscam transpor a fragilidade da representação estática, reconhecendo a influência da câmera no espaço ritual e as crises epistêmicas que o ato de fotografar em contextos tão sensíveis pode provocar. É um diálogo visual sobre a agência das imagens na construção da memória e na salvaguarda de práticas ancestrais, convidando o público a um olhar empático e a uma compreensão mais encarnada das religiosidades afro-indígenas.