Durante a pandemia se viu o quanto a vida é insignificante diante da potência de um vírus letal e foi inevitável uma reflexão sobre o que vivemos até aquele momento. Diante da dificuldade para fotografar, me voltei para o que tinha produzido até então e me encontrei diante de imagens que me remetiam à minha infância em uma cidade sem luz elétrica no interior de Minas Gerais. Com a sua ausência, as luzes de lampião e lamparina projetavam imagens trêmulas e criavam na infância medos e sonhos tensos. As lanternas, pontos de luz que flutuavam, faziam ruídos secos nas ruas de cascalho e causavam enorme apreensão.
Quem será que vem lá? As noites de lua cheia e as brincadeiras atenuavam os medos da escuridão. Ao entrar no meu acervo fotográfico, percebi que várias imagens refletiam a memória deste mundo denso, influenciadas também por outras referências visuais adquiridas ao longo dos anos. O tratamento dado às imagens criou o clima que vivi nessa época gerando um projeto que denominei “No meu sonho não tenho mais medo do escuro”. Esse projeto, do qual mostro um recorte, deverá se tornar um fotolivro. Sair desse mundo da infância é difícil, e possivelmente eu nem queira esquecê-lo, pois as alegrias que vivi são maiores que o medo que tinha da escuridão. No final, creio que o projeto está se tornando uma autoficção imagética.