A pandemia transformou a vida de grande parte da população mundial.
As grandes cidades viraram prisões verticais, enquanto aqueles que tinham a oportunidade migraram para o campo e para as periferias.
Locais de lazer, estadia de férias e fins de semana, ganharam a denominação de lar, na busca de um pouco mais de liberdade, por proteção e refúgio de um vírus desconhecido.
O mesmo destino seguiu o sítio dos meus pais habitado desde então pelo meu pai e minha mãe. A solidão de estar longe da família fez com que a relação deles se fortalecesse a medida que os longos dias iam se passando.
Mas o sonho se tornou uma prisão. Regressar não era mais uma opção.
A dualidade de um dia de trabalho braçal, de dois idosos de 70 anos, contrapõe o privilegio de ter o ar puro entrando nos pulmões.
O corpo não responde mais aos comandos, a enxada está mais pesada. A coluna pede um tempo para recuperar da dor de um dia de trabalho.
Se dedicar ao compromisso diário com a terra, que te alimenta e te prende é um desafio corajoso.
A vida dos animais depende da presença, da constância.
A água pura chega da nascente, a madeira para o fogo está ali a dois passos da cozinha, nos pés do eucalipto.
Todas as vantagens da vida fora das grandes cidades e frutos colhidos nessa construção durante a pandemia, com o passar do tempo, vêm estabelecendo um questionamento: a liberdade do campo se prende no compromisso com a criação.
Eles escolheram o espaço físico maior, a sensação de leveza e liberdade que a natureza traz, mas as obrigações diárias com o sítio e com a dedicação excessiva que a terra demanda, coloca na vida de dois idosos outro tipo de prisão.
E eles pagam com a privação de liberdade de ir e vir, uma vez que a vida das plantas e dos animais exige a presença e o olhar rotineiro dos seus moradores.