O poema Nova Poética, de Manuel Bandeira, desafia a idealização ao propor uma estética sórdida – uma poesia que abandona a busca pelo belo intocado e se entrega às impurezas da vida. A imagem da nódoa de lama no paletó branco sintetiza esse embate: a tentativa de manter-se imaculado frente à inevitável interferência do mundo. “É a vida.”
O ensaio Muxoxo parte dessa mesma tensão. Composto por imagens de arquivo inicialmente descartadas, resgata o erro como elemento essencial da criação. Fotografias rejeitadas por imperfeições técnicas são recuperadas e reinterpretadas, questionando o conceito tradicional de precisão estética. O que era falha agora se torna expressão, subvertendo a lógica do descarte.
Na fotografia, assim como na poesia de Bandeira, há um confronto entre a idealização e o real. A composição, a luz e a nitidez exigem rigor técnico, mas o acaso e a imperfeição escapam ao controle. O muxoxo surge nesse instante de frustração – um gesto breve, quase imperceptível, que acompanha cada tentativa falha. Mas aqui, ele se transforma em narrativa visual, reafirmando que a mácula não invalida a imagem, mas a imprime nela.
Este ensaio revisita o erro como matéria-prima e questiona o que define o belo e o aceitável. Assim como na poesia modernista, a imagem também carrega suas marcas, revelando que toda nódoa permanece – não como sinal de perda, mas como testemunho da criação.