O mestre americano Ansel Adams é a grande referência do fotógrafo André Monteiro, 69 anos, que se especializou em fotografia de natureza de uma forma pouco usual: ele decidiu mostrar paisagens, flora e fauna em P&B. Outra característica marcante do trabalho de Monteiro é sua dedicação ao Cerrado, o segundo maior bioma do Brasil. O contato com o Cerrado começou quando ele mudou do Rio de Janeiro para Goiás em 1978 para trabalhar como cartógrafo, sua formação inicial. Já a guinada para a fotografia ocorreu em 2006, ao decidir investir em conhecimento e equipamento para registrar a riqueza natural dos chapadões goianos e do Parque Nacional das Emas.
Como se dedica a fotografar o Cerrado há bastante tempo, a experiência fez com que Monteiro desenvolvesse alguns artifícios para conseguir os resultados que procura. Ele menciona que registrar aves é complicado porque o céu ao fundo “engana” o fotômetro e é fácil o fotógrafo perder a referência no enquadramento. “Em casos assim, tento sempre fazer as fotos sem céu, no nível do meu olhar. Espero um pouco, a ave decola e começa a voar. Esse é o momento ideal, pois consigo, com a maior abertura que a lente permitir, manter apenas a ave em foco”, explica.
Muitas das dificuldades técnicas Monteiro aprendeu a resolver com a prática. Para ele, a fotografia de paisagem é mais difícil do que a de vida selvagem, pois imagens de bichos têm uma dependência maior do equipamento. “Se você não tem uma tele longa, vai dificultar muito. Mas, com o equipamento adequado, facilita mesmo com todos os inconvenientes, pois você tem recursos para se aproximar a uma distância que não assuste o animal”, pondera. Já na fotografia de paisagem Monteiro afirma que é muito difícil conseguir transmitir a beleza do que você está vendo. “É preciso mais reflexão, muito mais cuidado e tempo para analisar a cena. Exige ainda visitas ao local, já que, se você descobre um cenário maravilhoso, precisa voltar lá em diferentes horas do dia”, comenta.


De olho no tempo nublado
Para Monteiro, um fotógrafo para ter êxito em imagens de paisagem precisa de conhecimento técnico, equipamento de qualidade (sendo crucial um tripé de alto nível) e olhar bem desenvolvido – que para alguns, segundo ele, é inato, enquanto para outros é necessário treinamento. “Se você tiver dois dos três requisitos, raramente vai fazer um trabalho de excelência”, opina.
Algo que ele aprendeu ao fotografar paisagens no Cerrado foi desprezar um atraente dia de Sol com céu azul. “Uma das maiores dificuldades para conseguir fotos de paisagem em P&B que tenham dramaticidade, profundidade e perspectiva é o céu”, diz. Explica que, como o Cerrado é caracterizado por grandes espaços físicos, quanto mais nublado estiver o dia, melhor. “Às vezes, você sai a campo esperando fotos fantásticas e elas saem com aquele céu cinza, sem graça. Aprendi que as fotos de natureza e paisagem em P&B que mais se destacam são as feitas no período de chuvas, com nuvens muito carregadas, tempestades”, ensina.
Por isso, ele sempre procura fotografar paisagens durante o período de chuva no Centro-
-Oeste, que vai de outubro a maio. Já o período de seca, de junho a setembro, é a época das grandes floradas de ipês-amarelos e roxos, com céu muito azul. “Aí é mais apropriado para se trabalhar o uso da cor, mas, mesmo assim, ainda faço alguma coisa em P&B nesse período”, conta. Ele lembra que um fator que dificulta registrar a natureza em P&B é a falta de contraste. “Nas fotos de animais, por exemplo, se o fundo é de mata fechada, complica, porque para dar destaque ao animal preciso de pouca profundidade de campo. Aí, é necessário separar muito bem o assunto principal no enquadramento, e isso se torna mais difícil com o P&B por causa do contraste”, comenta.


Imagens atemporais
Foi por influência de Ansel Adams (1902-1984) que ele começou a fazer experimentações em P&B – ele fotografa em arquivo RAW e depois converte na pós-produção. “O meu material é feito, em sua grande maioria, dentro dos limites do Parque Nacional das Emas, a maior unidade de conservação do bioma Cerrado no mundo, declarado Patrimônio Natural da Humanidade pela Unesco”, informa.
Para o público em geral, não habituado com a técnica fotográfica, o tipo de trabalho que André Monteiro realiza pode ser uma descoberta de sensibilidades pouco exploradas. O fotógrafo conta que, na abertura de uma das exposições que fez em Goiânia (GO), um senhor que observava as obras veio até ele para dizer que via as cores nas fotos, o que foi uma surpresa para o autor. “A leitura visual do P&B traz uma percepção tão profunda que as pessoas conseguem enxergar cor, ainda que de maneira subjetiva. As imagens em tons de cinza carregam uma emotividade singular, que faz relação com o passado, o saudosismo e, principalmente, a perenidade. Parecem atemporais”, analisa.
Adams é a maior referência, mas não é a única. No Brasil, André Monteiro tem em Luiz Claudio Marigo e Araquém Alcântara as principais inspirações, além de Sebastião Salgado, cujo trabalho ele estudou bastante para tentar entender como ele atingiu tecnicamente a perfeição para reprodução de imagens em P&B.
Cita ainda o carioca Ary Bassous, premiado no maior concurso de fotografia de natureza do mundo, o Wildlife Photographer of the Year, organizado pelo Museu de História Natural de Londres. Outros dos quais ele admira as obras a distância, embora não sejam focadas em P&B, são João Marcos Rosa, André Dib e Luciano Candisani.


Da cartografia à fotografia
O caminho que o fotógrafo André Monteiro percorreu até a fotografia de natureza em P&B começou pela cartografia. Hoje, ele consegue unir a graduação em Engenharia Cartográfica pela Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ) com uma pós-graduação em Geoprocessamento por Imagens pela Universidade Federal de Goiás (UFG) mais a formação de fotógrafo profissional pelo New York Institute of Photography (curso feito nos EUA entre 2010 e 2012). A primeira parada em Goiás foi na cidade de Mineiros, em 1978, onde Monteiro trabalhou como cartógrafo. Voltou para o Rio em 1979 e depois retornou, fixando-se em Goiânia a partir de 1989.
Desde que começou a se dedicar à documentação do Cerrado, em 2006, publicou dois livros: Memórias: Boiadeiros do Cerrado (editora do Instituto Casa Brasil de Cultura, Goiânia, em 2010); e Parque das Emas, no Coração do Cerrado (LL Editora, Goiânia, 2018). Um terceiro está pronto, previsto para ser lançado no primeiro semestre de 2021: Águas do Cerrado.
Acostumado às câmeras DSLR, Monteiro adquiriu meses atrás a médio formato Fuji GFX 50R. Diz que os resultados são incomparáveis ao que havia visto até hoje. “Sou usuário antigo da Nikon, tenho uma D850. Já tinha algumas lentes, anteriores às câmeras digitais, e permaneci trabalhando com elas. Porém, ultimamente, tenho usado muito mais a Fuji para fotos de paisagem. Fotos de vida silvestre, de animais a longa distância, de pássaros, aí é com a Nikon porque tenho mais longas e mais leves”, comenta.
Na bolsa, ele leva lentes Nikkor fixas de 20 mm e 35 mm e uma zoom tele 200-400 mm f/4, que usa às vezes com um teleconversor de 1.4x – comprou recentemente uma mirrorless Z50 para usar as mesmas lentes. Da Fuji, tem uma lente normal e a grande angular fixa de 23 mm e uma zoom 32-64 mm f/4. O kit se completa com um tripé Benro e um monopé Manfrotto.

