Com uma trajetória de três décadas na fotografia de natureza, o paulistano Adriano Gambarini, de 51 anos, consolidou um amplo portfólio, que inclui imagens de vida selvagem, cavernas, paisagens e aéreas. Defensor da técnica acima de recursos digitais, da imagem fidedigna em vez de manipulação e de trabalho a longo prazo, ele diz que, de todas as lições que aprendeu e incorporou ao longo da jornada, nenhuma provou ser tão importante quanto um preceito simples porém fundamental na sua especialidade: saber esperar.
A lição é válida sobretudo na documentação da fauna silvestre, já que os animais não estão à disposição do fotógrafo e na maioria dos casos se escondem quando identificam presença humana. É preciso muita dedicação e disponibilidade para passar dias e às vezes semanas registrando animais, só assim é possível obter boas imagens – segundo o especialista, na natureza selvagem não existe “instante decisivo” capturado instintivamente, as imagens surpreendentes exigem muita dedicação.
Além do tempo dedicado em campo, é necessário estudar os hábitos e comportamentos das espécies que se deseja fotografar. Por conta de uma escolha pessoal, Gambarini não usa a técnica conhecida como câmera trap (armadilha, em inglês), que consiste em posicionar uma câmera com sensor de movimento que dispara quando percebe a movimentação de algum bicho diante das lentes. Essa técnica, muito usada para documentar hábitos de animais em geral, permite fotografar sem estar presente na cena. “Não uso câmera trap por um motivo simples: gosto de observar antes de tudo. Talvez minha primeira reação diante de um animal seja mais de naturalista do que de documentarista”, compara.
Gambarini ressalta que sua carreira é baseada em muitos anos de estudo e planejamento, com trabalhos que envolvem um processo sistemático de longo prazo. “Demorei quinze anos fotografando lobo-
-guará para produzir um livro e outros dezessete para fazer o livro sobre as onças-pintadas. Já o livro sobre cavernas foram dezoito anos. Só na documentação do pato-mergulhão, uma das aves aquáticas mais raras e ameaçadas do mundo, foram mais de quatorze anos”, comenta. Logicamente, ele desenvolveu esses temas de maneira simultânea, mas pontua que para um fotógrafo realizar um trabalho de peso sobre determinado assunto é preciso muita dedicação.
Tratamento x manipulação
A pós-produção tem pouca presença no trabalho de Adriano Gambarini. Ele mesmo trata as imagens, com ajustes mínimos. Na sua opinião, é preciso diferenciar tratamento de manipulação. No momento em que o fotógrafo começa a alterar a realidade presenciada na hora do clique, passa a manipular. “Parto do princípio que se eu tiver que ficar muito tempo na pós-produção é porque errei na hora do clique. Fotografia é o produto originado na hora do clique. Sou fotógrafo, não sou um ‘tratador’ de fotos. Existe uma linha muito tênue entre fotografia e arte digital. Acho que está mais do que na hora de o mercado separar fotografia de arte digital. São produtos distintos”, afirma.
Para Gambarini, o tratamento digital trouxe avanços importantes para a fotografia de um modo geral, mas também trouxe alguns “perigos”, principalmente fotografia de natureza, que deve desenvolver uma abordagem documental, ser fidedigna, segundo ele. “Algumas pessoas perderam o bom senso. É comum ver fotos de bichos ou lugares que conheço, e penso: ‘Esse bicho não tem essa cor, aquela montanha não existe ali. É impossível uma contraluz assim’. No momento em que a pessoa faz uma foto e manipula a esse ponto, não considero o tratamento digital um avanço. Isso não é fotografia documental de natureza. Se quiser tomar outro rumo, sem problemas. Mas que fique bem claro que houve manipulação”, reforça.
Gambarini recorre ao flash como luz de preenchimento ou para iluminar em fotos de cavernas, uma de suas especialidades. Diz gostar bastante da contraluz, mas “sem firulas”, da forma mais simples e original possível. Quanto aos inúmeros recursos trazidos por modelos de câmeras digitais atuais, como bracketing, HDR, captura contínua e panorâmica, nenhum deles faz parte de seu repertório. Longas exposições ele utiliza apenas em fotos de caverna e imagens noturnas. “Prefiro não usar esses recursos digitais. Minhas fotos são tal qual sempre fiz, desde a época do filme. Costumo contornar as dificuldades inerentes em uma cena por meio das regulagens e técnicas convencionais da fotografia, abertura, velocidade e luz. Temos que entender a relação de luz e sombra, buscar o enquadramento que se quer e esperar o momento certo do clique. Ter paciência é fundamental”, ensina.
Na mão, sem tripé
A fotografia de natureza costuma exigir um grande rol de lentes, de grandes angulares amplas para paisagens até as superteles para registro da vida selvagem. Muitos fotógrafos acabam atuando com a ajuda de um assistente, para carregar o equipamento. Não é o caso de Gambarini, que opta por levar o equipamento mais compacto possível quando sai a campo. Ele trabalha com equipamento Nikon. Tem três corpos de câmera, uma mirrorless Z6 e duas DSLRs, a D4S e D850, e várias opções de lentes, desde uma olho-de-peixe 10 mm f/2.8 até uma 200-400 mm f/4.
Mais uma opção dele que está na contramão da maioria dos fotógrafos de natureza: raramente usa tripé ou monopé, apesar de ter ambos. A lente de 200-400 mm, segundo o fotógrafo, dá para ser sustentada na mão. “É pesada, mas peguei o jeito. Além disso, em praticamente todas as situações que vivi fotografando vida selvagem tinha que ir atrás dos bichos e me camuflar na mata. Simplesmente não dava tempo de armar o tripé. Em quase todas as minhas viagens sou contratado por instituições e ONGs, para ir a regiões remotas. Não tenho assistente, ou seja, carrego todo o equipamento”, explica. Leva o tripé para eventuais fotos de paisagem dentro de floresta ou cavernas, que exigem longa exposição. Filtros, monopé e teleconversor também não costuma usar. “Busco ser o mais sucinto possível em termos de equipamento pela praticidade”, conta.
Gambarini também tem um extenso portfólio de imagens aéreas. Sempre que fazia os orçamentos de viagens, buscava programar o aluguel de helicóptero, monomotor ou de ultraleve para fazer esse tipo de imagem, o que encarecia de forma significativa. A chegada dos drones facilitou bastante a obtenção de tomadas aéreas. Por isso, ele usa o modelo Mavic 2 Pro mais recente, fabricado pela DJI.
Aos interessados em começar na fotografia de natureza, o especialista recomenda investir em uma câmera DSLR e uma lente zoom que cubra de grande angular (para paisagens) a teleobjetiva (para cenas distantes) – como as opções 18-200 mm, 24-240 mm ou 28-300 mm. “Gosto de sugerir esse equipamento básico para quem está começando porque facilita no início. Comprar muitas lentes intercambiáveis pode acabar atrapalhando e até frustrando a pessoa”, explica Gambarini.