Belga radicado em São Paulo, Alexander Decoster encontrou na fotografia muito mais que uma profissão – uma ferramenta de equilíbrio e reconexão consigo mesmo. Após uma carreira internacional de três décadas em uma multinacional, redescobriu sua paixão pela imagem em 2009, transformando-a em uma jornada de contemplação e compartilhamento de beleza. Sua trajetória fotográfica, iniciada ainda na infância com presente do pai, evoluiu das paisagens para as narrativas humanas, sempre com um olhar sensível à luz e às texturas do mundo.
Seu ensaio “Devoção“, finalista na categoria Ensaio do Prêmio Portfólio FotoDoc 2025, é um testemunho dessa transformação. Realizado durante o festival Timket (Epifania) em Gondar, na Etiópia, o trabalho captura a intensidade espiritual e a devoção profunda dos participantes dessa celebração religiosa. As imagens, feitas em janeiro de 2019, transcendem o registro documental para transmitir a emoção e o fervor de uma experiência que marcou decisivamente a trajetória do fotógrafo – foi neste momento que Decoster percebeu seu chamado para a fotografia documental autêntica, onde histórias humanas se tornam o centro de sua expressão artística.
Descubra mais sobre esta jornada de descoberta fotográfica e os projetos atuais do fotógrafo na entrevista que segue.



Quantos anos tem? Onde vive e trabalha atualmente?
Nascido em Oostende, Bélgica, tenho 64 anos e atualmente vivo com minha esposa, Sonia, em Vila Madalena, São Paulo. Sou aposentado, após mais de 30 anos de carreira profissional internacional em uma multinacional belga.
Conte um pouco da sua trajetória pessoal na fotografia. Quando começou a fotografar e por que? Qual papel tem a fotografia em sua vida?
Ganhei minha primeira câmera aos 8 anos, presente do meu pai, que adorava registrar as festas de família e nossas viagens de férias ao sul da França. Desde então, desenvolvi um olhar atento para a natureza, especialmente para paisagens.
Com o passar dos anos e devido a uma carreira que me levou a diferentes países e continentes, a fotografia acabou ficando em segundo plano. Foi apenas em 2009 que redescobri a magia da luz — e encontrei nela uma forma de manter o equilíbrio.
Em meio ao estresse de longas reuniões, agendas exigentes e viagens constantes, a fotografia me oferecia um momento de clareza, uma forma de me reconectar comigo mesmo. Sozinho na natureza, câmera em mãos, sentia o mundo desacelerar enquanto sua beleza se revelava de maneiras inesperadas.
O que começou como uma fuga pessoal transformou-se em algo maior: cada imagem capturada parecia abrir uma porta para sonhos, calma e encantamento. Percebi que podia compartilhar esses momentos, oferecendo não apenas fotografias, mas convites para se afastar do ruído e entrar em um mundo de luz, textura e possibilidades. Minha fotografia não é apenas sobre o que vejo, mas sobre o que espero que cada pessoa encontre ao olhar minhas imagens.



Conte um pouco sobre seu trabalho finalista do Prêmio Portfólio FotoDoc 2025. Quando e onde foi realizado? Qual a proposta? De que maneira e em que medida ele se encaixa em sua produção fotográfica?
Embora a fotografia de paisagem seja minha grande paixão, com o tempo descobri que retratar pessoas também me fascina. Ao me aproximar delas com respeito e sensibilidade, encontrei portas abertas para suas histórias.
Foi assim também durante uma viagem à Etiópia, em 2019. Nos últimos dias dessa jornada, vivi momentos intensos em Gondar, durante o Timket (Epifania) — um festival vibrante e profundamente religioso que celebra o batismo de Jesus Cristo por João Batista no Rio Jordão. As festividades começam na véspera, 18 de janeiro, conhecida como Ketera, com procissões e cerimônias. No dia 19, há a bênção da água e a encenação simbólica do batismo.
Fiquei impressionado com tamanha devoção que não pude deixar de registrar. As fotos apresentadas foram feitas em Gondar, na noite e madrugada de 18 para 19 de janeiro de 2019.
Para ser muito sincero, o motivo de inscrever esta série no concurso é que essa experiência foi determinante para minha decisão de me dedicar mais à fotografia documental. Percebi que captar as histórias e emoções das pessoas é algo profundamente fascinante.
Em quais projetos trabalha atualmente? Quais seus planos para o futuro próximo em termos de produção fotográfica?
Como mencionei anteriormente, as vivências e emoções daquela noite foram, acredito, o ponto de partida para que eu seguisse com mais intensidade o caminho da fotografia documental autêntica.
Em 2022, mergulhei por algumas semanas na vida de duas comunidades indígenas no Acre e, mais recentemente, descobri o trabalho inspirador do fotógrafo brasileiro João Roberto Ripper. Desde então, tenho participado de imersões em comunidades locais no Brasil, buscando não apenas registrar imagens, mas compreender e compartilhar suas histórias.

