A produção fotográfica de Felipe Fontoura é marcada pelas passagens entre analógico e digital, documento e ficção. Em sua criação autoral, ele busca brincar com a fronteiras, transgredindo-as. É o caso da imagem intitulada “Laços e Tutus”, uma das finalistas do Prêmio Portfólio FotoDoc 2024. A obra é inspirada em uma ilustração do multiartista Cassiano Pires que mostra homens africanos com vestuário de ballet.
Para produzir a fotografia, Felipe Fontoura reuniu dois dançarinos pretos e os vestiu com roupas de bailarina. A proposta foi criar uma imagem bela e ao mesmo tempo transgressora, borrando as fronteiras de gênero, etnias, corpos e afetos.
Descubra mais sobre a instigante produção do fotógrafo na entrevista abaixo.
Quantos anos tem? Onde vive e trabalha atualmente?
Tenho 56 anos e vivo e trabalho em São Paulo.
Conte um pouco da sua trajetória pessoal na fotografia. Quando começou a fotografar e por que? Qual papel tem a fotografia em sua vida?
Desde criança a fotografia já fazia parte do meu cotidiano. Câmeras descartáveis, amadoras e profissionais compunham os ambientes e o meu interesse. Minha decisão de viver a fotografia como forma de existir começou aos 16 anos. Desde então é parte de mim, um misto de analógico e digital.
Poder criar uma imagem, narrar uma história, levantar espelhos da alma, registrar instantes que formam o tecido do tempo… Todas e outras razões se aglutinam num único frame: a busca da luz. Sua escrita, sua rota, seu destino e a sua falta. A fotografia me ensinou a construir uma ideia, numa tradução visual que pode vir assim, de forma instantânea tipo Polaroid, ou num exercício de respeito e dignidade ao tempo, como numa longa exposição.
Projetos fotográficos como “O lugar de cada um” (Curitiba e São Paulo – de 2008 à 2016 – https://olugardecadaum.com.br/ ), ou o “Maracatu Bloco de Pedra”, com registros de ensaios, apresentações e oficinas de um grupo de maracatu em São Paulo (desde 2013); são exemplos das propostas que apresento: pessoas, histórias, cultura e costumes, uma antropologia em cor e preto e branco, feita de luz e sombra, um tanto registro e um tanto ficção e acompanhado do próprio tempo, a costura todo este tecido.
Conte um pouco sobre seu trabalho finalista do PPF 2024. Quando e onde foi realizado? Qual a proposta? De que maneira e em que medida ele se encaixa em sua produção fotográfica?
“Laços e Tutus” foi o meu primeiro ensaio autoral após a minha mudança para São Paulo em 2011. Me inspirei numa ilustração do multiartista Cassiano Pires
que mostrava homens africanos com vestuário de ballet. Esta imagem me marcou por anos até reunir todos os elementos desta construção visual. Os modelos eram bailarinos e o ensaio foi realizado numa academia de ballet. O que me instigou foi a criação de algo que estivesse no campo da estética, mas com espírito transgressor. Andar nessa corda bamba limítrofe das realidades, brincar com as fronteiras de gênero, etnias, corpos e afetos. Uma assinatura de trajetória autoral, que exprime desejo, fantasia e humor.
Em quais projetos trabalha atualmente? Quais seus planos para o futuro próximo em termos de produção fotográfica?
Estou envolvido com vários projetos ao mesmo tempo. Projeto “Ilumina” registra pessoas pretas, de todas as idades e gêneros. Aos participantes é entregue um ring light e eles mesmos se iluminam, um registro bem pessoal.
Em paralelo, desenvolvo outro trabalho intitulado “Cara de Homem”, cem portraits frontais masculinos, com inspiração nos estudos de fisiognomonia.
O “Eu, Tu, Natureza” é um terceiro trabalho, com um perfil de colecionismo, que busca registrar o resultado das relações humanas com a natureza, especialmente o reino vegetal nos centros urbanos. Fugindo e apartando-se daquilo que é natural à vida, o ser humano constrói muros e cercas; reduz e aliena, enquadra e aprisiona, comporta-se como inimigo de algo que é parte integrante.