A série CAPILARIDADE, de Virna Santolia, partiu de um recorte do acervo de mais de 500 fotografias de seu trabalho profissional. São fotografias do passo a passo de revistas especializadas em beleza e bulas de produtos, fotos a priori técnicas, que foram, no entanto, apropriadas em um processo artístico de escavação e ressignificação.
O mergulho nesta coleção de fotografias, onde as modelos são apresentadas sempre de costas, tendo o cabelo como protagonista do enredo visual, nos sugere algumas reflexões, bem como nos remete a referências subjetivas como o trabalho do fotógrafo nigeriano J.D. Okhai Ojeikere e as Irmãs Xifópagas de Tunga.
Ao desvelar o processo de busca da beleza idealizada – verdadeiro regime imposto às mulheres numa sociedade que normatiza padrões ligados à cultura eurocêntrica – esta série provoca o descentramento de nosso olhar, propondo outras possibilidades para pensar o conceito de belo e um questionamento acerca dos meios empregados pela mídia e pelas instituições para introjetar nos corpos e sujeitos certas prerrogativas de comportamento e crenças. Em tempos radicais como o que vivemos no mundo, não deixa de ser um gesto da ordem micropolítica.
Na fotografia publicitária – ilustração do mundo do consumo – as imagens finais são o objetivo em si. Buscam a perfeição, são determinadas e planares. No entanto, nesta série, mesmo tomando partido de um código publicitário, o foco é direcionado para o processo, o “entre”, sugerindo nestas imagens uma dimensão escultórica e provisória. O procedimento inventariante de Virna Santolia contém um desejo pelo que é relegado à margem. Um certo fascínio pelo fragmento e pelo que é descartável que, ao ser deslocado de seu contexto de origem, areja o campo do retrato fotográfico.
Marcos Bonisson e Patricia Gouvêa