Chão de Histórias é uma travessia entre tempo, matéria e memória. Um gesto de escuta diante do que foi silenciado — na terra, nos arquivos, nos corpos. A partir de uma busca pessoal por raízes apagadas, o projeto se constrói como uma cartografia afetiva do sertão pernambucano, território de origem da família do meu pai e lugar que, por muito tempo, me foi ausente.
O trabalho parte do encontro entre imagens de arquivo e fotografias contemporâneas, e se aprofunda em duas séries que tensionam as fronteiras entre o passado herdado e o presente vivido:
Dobra do Tempo reúne colagens compostas por fotografias de paisagens que realizei em 2022 nas regiões de Floresta e do Vale do Catimbau, somadas a imagens de arquivo familiar recortadas à mão e a rendas renascença — tradição têxtil trazida por freiras francesas no século XIX e transmitida às mulheres sertanejas. As composições criam dobras visuais e simbólicas: tempos que se sobrepõem, memórias que se costuram, formas que ecoam.
Encontro é uma síntese sensível de origem. Retratos de ancestrais são combinados à argila seca e arenosa do sertão — a terra que guarda, resiste e também lembra. Nessa série, a argila não é suporte, mas corpo. Ela acolhe as imagens como se fossem vestígios orgânicos da paisagem, afirmando que somos inseparáveis do solo que nos gera e nos devolve.
Ambas as séries propõem uma arqueologia íntima: uma tentativa de reconstituir laços por meio da justaposição de gestos, materiais e silêncios. Entre o visível e o velado, Chão de Histórias convida o olhar a repousar no que pulsa sob a superfície — um tempo ancestral que ainda respira, e espera ser reativado.