Quando o íntimo é comum iniciou como uma proposta de visibilização de um certo tipo de habitação: as casas estudantis. Quis falar de diversas periferias que migram para o centro e alteram a paisagem urbana. É como uma rachadura numa área não acostumada com o trânsito e presença de alguns corpos. É também, uma outra possibilidade de experienciar o urbano que só se dá conta quem vivenciou cotidianamente o deslocamento periferia-centro-periferia.
Mas, de repente, eu, enquanto mulher periférica e moradora da Casa da Estudante Universitária de Curitiba, onde foram feitas todas as fotografias, pude exercitar um pouco da minha liberdade poética para falar de intimidade. A elaboração lenta, realizada e pensada ao longo de 2023, foi fazendo com que discretamente algo fosse se mostrando e então eu compreendi que poderia também seguir por este caminho mais subjetivo. A intimidade na CEUC tem sua partilha às vezes consentida, e muitas vezes não. Morar em coletivo é afetar-se constantemente pelo outro, e é bonito (e muito bonito) quando a gente, enquanto pessoa moradora, acaba sendo afetada positivamente por um ser desconhecido, que se não fosse a condição desprivilegiada financeiramente, a distância de casa e um curso superior, dificilmente teria acontecido.
As fotografias sugerem, em algum nível, uma convivência harmoniosa, no caso das que dividem quarto no momento da foto, mas nem sempre isso se concretiza. Também denunciam gostos, modos de viver e fragmentos de cada uma. Há ao menos uma sugestão, embora também haja possibilidades outras de imaginar. Que bom. De alguma maneira, acredito que Quando o íntimo é comum está entre dois trabalhos de referência: Virginia de Medeiros (Alma de Bronze 2016-2018) e Rochele Costi (Quartos, 1998). Virginia com seus retratos de lideranças femininas dentro de uma ocupação e Rochele com uma espécie de teletransporte momentâneo para quartos das mais diversas naturezas.