Nego Bispo defende que, muito mais do que preservar, é necessário reaprendermos a nos relacionar com o meio ambiente das mais diferentes formas, especialmente as afetivas. Penso que a reconexão e o relacionamento com o meio ambiente podem expressar o reconhecimento que o reino vegetal é responsável pela produção do oxigênio, indispensável à vida; pode também evidenciar um cuidado e uma delicadeza que permitem ampliar o olhar sobre a essência das “coisas” e a reconhecer e valorizar a beleza do “simples”, do genuíno, da emoção, gerando posturas mais pacíficas e intuitivas.
Há alguns anos, o meu trabalho busca o diálogo entre a fotografia, a natureza e o sagrado. Fotografo rituais de religiões de matriz africana que emocionam e impactam fortemente o meu olhar e me lembram que as folhas têm simbolismo e importância vital enquanto um dos fundamentos do Candomblé. Sem folhas é impossível realizar qualquer ritual.
“ko si ewe, ko si Orixa” ou seja: ”Sem Folha Não Existe Orixá”.
“Sem folha não tem sonho
Sem folha não tem festa
Sem folha não tem nada”
Ildasio Tavares / Gerônimo)
As imagens que agora apresento foram capturadas digitalmente, têm folhas in natura como suporte para revelação e foram processadas utilizando a Fitotipia. Utilizo o sol da Bahia e a Fitotipia, um processo fotográfico histórico, delicado, ecologicamente correto, de baixo impacto ambiental para a revelação de imagens através da ação sobre pigmentos botânicos fotossensíveis.
O processo de coleta da folha, a escolha da foto que melhor se ajuste aquela folha, a exposição ao sol e finalmente a surpresa da revelação promovem uma forte conexão com a natureza; me identifico, me percebo e reconheço os ciclos de minha vida, a impermanência dos processos vitais e a possibilidade de escolha em cada fase. Sinto meus sentidos ativados, compreendo que o diálogo se faz em todas as etapas do processo e percebo que cada folha carrega uma história: uma história de “Tradição” pela possibilidade de articular processos fotográficos históricos e o Sagrado, e uma história sobre “Tempo” porque é impossível definir, a priori, o tempo de exposição ao sol.
Naturalmente, o processo se torna uma “oferenda” a Iroko, o Orixá do Tempo que se impõe tanto pelo tempo necessário para a revelação da imagem como também pelo tempo para que se mantenha na folha, remetendo à condição de impermanência e à transformação de uma coisa conhecida à uma nova “realidade”. É como se eu penetrasse na estrutura a fim de mostrar não o objeto em si, mas aquilo que ele esconde, um real apontamento da beleza do imperfeito e impermanente – uma religação com a essência da vida.
O portfólio que apresento é um recorte de uma série que venho construindo nos últimos anos e que registram desde um altar para culto aos Orixás como também a alegria transmitida pelos sons dos atabaques a caminho das oferendas; a alegria no encontro das filhas de santo que desempenham papel importante nas práticas religiosas ou por, o orgulho em carregar um pesado balaio com oferendas ou ainda pela transmissão oral dos saberes pelas mães às crianças.
Uma observação: caso venha a ser selecionada, me proponho a apresentar algumas folhas com imagens reveladas, além da impressão dos registros das Fitotipias apresentadas a seguir.
Leila Chandani
Maio/2025













