Nascido em Manaus (AM), Raphael Alves usa a fotografia como forma de falar da própria existência, trabalhando principalmente na região norte do Brasil e abordando temas sensíveis. Captada em Boa Vista (RR), a forte imagem intitulada “Resgate aos Yanomami“, finalista do Prêmio Portfólio FotoDoc 2023, é um exemplo eloquente disso.
Simboliza a documentação do resgate e do tratamento oferecidos pelo governo brasileiro aos indígenas Yanomami, acometidos por doenças e desnutrição diante do avanço ilegal de mineradores em suas terras. Exibe o resgate de uma senhora que não conseguia ficar de pé e por isso teve de ser carregada.
Sobre a mesma temática, Raphael Alves também teve um Ensaio e um Portfólio selecionados e publicados no âmbito do Prêmio Portfólio Fotodoc 2023. Conheça um pouco mais de sua trajetória na fotografia e dos temas que aborda na entrevista abaixo:
Quantos anos tem? Onde vive e trabalha atualmente?
Tenho 40 anos. Vivo em Manaus-AM, onde nasci. Trabalho na região Norte, sobretudo no Amazonas.
Conte um pouco da sua trajetória pessoal na fotografia. Quando começou a fotografar e por que? Qual papel tem a fotografia em sua vida?
Comecei a fotografar logo no primeiro ano de universidade. Estudei Jornalismo na Universidade Federal do Amazonas (UFAM) e escolhi o curso justamente por causa da fotografia. Trabalhei em veículos locais: jornais e revistas. Depois cursei um mestrado e comecei a colaborar com agências de notícias e veículos de abrangência nacional e internacional. Para mim, a fotografia é mais que meu trabalho. É a forma que encontrei para melhor interpretar o mundo que me cerca. Ela me permitiu até hoje conhecer e contar histórias, ver coisas, mas sobretudo entender o que eu tenho a ver com tudo o que está em volta. E esse é um dos motivos que me faz ter ainda mais ímpeto de trabalhar na região em que nasci. Fotografar, de certa forma, é falar da minha própria existência.
Conte um pouco sobre seu trabalho finalista do PPF 2023. Quando e onde foi realizado? Qual a proposta? De que maneira e em que medida ele se encaixa em sua produção fotográfica?
A imagem foi realizada em Boa Vista-RR, e trata do resgate de pessoas do povo Yanomami acometidas por sérias doenças (como malária, pneumonia e gastroenterites agudas) e severa desnutrição em virtude da presença ilegal do garimpo em suas terras. A água, o solo em suas terras foram contaminados. Com isso, não há pesca, caça e plantio que não tenha sido também contaminada. Isso e prejudicou gravemente a alimentação do povo Yanomami. Aliadas às doenças causadas pela desnutrição e contaminação, o desmatamento causado pela mineração ilegal também levou a região a ser a líder em casos de malária no País. Tudo isso levou a uma crise humanitária profunda. Estive lá em janeiro deste ano, logo após ser declarada a emergência e em outra oportunidade no primeiro semestre.
É um cenário desolador. Essa senhora da imagem, não conseguiu ficar de pé tão grave era sua situação (malária severa, pneumonia e desnutrição). Como sou colaborador de uma agência de notícias, ofereci a cobertura e a agência me deu todo suporte para realizar o trabalho, que por sua vez têm muita relação com o trabalho que realizo na região, uma vez que os povos originários são os verdadeiros donos da terra em que vivemos e seguem sendo atacados desde o processo de colonização iniciado por volta do ano de 1500. Além do mais, em termos geográficos, a Terra Indígena Yanomami também toca o Amazonas, meu estado de origem. E, por fim e mais importante, não se pode simplesmente ignorar uma situação dessas envolvendo seres humanos: São séculos de exploração e destruição de vidas, línguas, culturas.
Em quais projetos trabalha atualmente? Quais seus planos para o futuro próximo em termos de produção fotográfica?
Sigo cobrindo histórias relacionadas aos povos indígenas, como as manifestações contra o Marco Temporal. Outra agenda importante do meu trabalho na região é a constante pressão do espaço urbano sobre a natureza. Tenho trabalhos a longo prazo que tratam da questão da água, saneamento, da floresta, da fauna. Quero seguir trabalhando neles, tendo como ponto de atenção primordial o papel do ser humano nesses conflitos.